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Insegurança

Atualizado: 14 de abr. de 2019

Vejo as gentes quando danço.


E nelas me vejo, obviamente.


Na rua é muito bom, e melhor ainda quando aí danço em segredo.


Vejo, então, tudo o que as pessoas fazem para se sentir seguras. E fica engraçado.


E fica estranho.


Mas tão estranho, que chego a inventar a ideia de que tudo o que elas fazem não é outra coisa senão ocupações para se sentirem seguras.


A forma e a velocidade que andam. Como se vestem e o que empenham no corpo. O que fazem das pernas, da coluna e das mãos quando sentam. O celular. As fotografias. Ajeitar e desajeitar cabelos. Olhar as horas. Falarem umas com as outras. Buzinarem. O celular. Discutirem. Comprar e vender. Carregar coisas e demandas e comê-las e cuspi-las e pisa-las...


Conversarem consigo mesmas e ter opiniões. Muitas opiniões, compulsivamente, inventa-las até, sempre que preciso, um modo mais de ataque do que de defesa, esse.


Parecem tão ocupadas quando assim seguras!


Por que se sentiriam tão seguras?


A sua atenção não se ocupa de vazios?


As distâncias estão eficientemente controladas, isso de quem se aproxima ou se afasta, o que toca o que não toca, das intenções?


Estão aceitas?

Não correm riscos de atropelamentos por carros, costumes, insultos ou leis?


Não sentem desamparos e falta de chão sob os pés ou céu sobre as cabeças?


Nem alguma vontade de gritar, como eu? Que desse jeito danço na rua, oculto ou não, vendo essas coisas?


É boa dança que seja um movimento na insegurança.


Sinto os limites da minha própria segurança física, emocional e social.


Sinto-me convidado pelos moradores de rua (rápidos em me notar!) e os cães sem dono. Uso habilidades de gato para me safar. Como um diabo brinco com o jeito que as pessoas me vêm ou não me vêm. Gosto de uns afagos. Gosto de uns medos. Vejo que elas podem se sentir muito inseguras comigo e, na ciência disso, às vezes estou gentil outras vezes menos. O risco maior é meu.


Essa dança de mover na insegurança é uma espécie de modo meu de me sentir seguro?

Sei que lá vejo as gentes e me vejo nelas.


E, claro, tanto quanto elas, aqui e acolá também disparo opiniões, tais que essas aqui escritas.

Dá uma certa proteção.


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